ROUBARAM MEU CARRO, O RESTAURANTE É RESPONSÁVEL ?

ROUBARAM MEU CARRO, O RESTAURANTE É RESPONSÁVEL?

De repente bateu aquela vontade de jantar fora, mas o meu carro está sem seguro. Então, vou ao Restaurante X que, além de boa comida, oferece serviço de manobrista. Vi até a “plaquinha” lá na frente e, se qualquer coisa acontecer, serei ressarcido. Será?

Depende do que acontecer. O serviço de “valet” oferecido pelo estabelecimento constitui um “plus” para atrair clientela. No momento da entrega do carro ao manobrista, aperfeiçoa-se um contrato de depósito envolvendo 3 personagens: o restaurante, a empresa de manobrista e o cliente.

Esse contrato representa uma cadeia de fornecimento de serviço e chancela a responsabilidade solidária e objetiva do restaurante e da empresa de manobrista, quanto à guarda e vigilância do bem confiado – artigos 627 do CC, 25, §1º e, 7º, parágrafo único, do CDC. Vejamos, “verbis”:

“Art. 627 do CC. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame.

Art. 7° do CDC. Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade.

Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.

Art. 25 do CDC. É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores.

§ 1° Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores.”

Esclareço que a responsabilidade é “objetiva”, porque não se discute a culpa (na subjetiva discute-se) e, “solidária”, pelo fato de o lesado poder cobrar de qualquer um, ou seja, do restaurante e da empresa, somente do restaurante ou somente da empresa. Isso porque a solidariedade é um instrumento de garantia para o credor, razão pela qual ele a aciona de quem quiser.

Assim, basta que o consumidor comprove o nexo de causalidade entre a prestação do serviço e o dano. Porém, há exceções: se os demandados comprovarem que não houve falha na prestação do serviço, mas, um “fortuito externo”, o dever de indenizar será afastado ante o rompimento do nexo de causalidade.

No ponto, veja-se o art. 14, § 3º, do CDC, “verbis”:

“Art. 14 do CDC . O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
(…)
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”

Exemplifico: a) se o manobrista foi assaltado, há um “fato exclusivo de terceiro” (o roubo praticado pelo bandido), pois a segurança é dever do Estado, afastando o dever de indenizar; e, b) se o carro foi furtado, porque o preposto esqueceu a chave na ignição e a porta destravada, existe falha na prestação do serviço e o evidente dever de indenizar. Simples assim!

Melhor contratar um seguro automotivo, não acha? Sobre o tema, confira-se, dentre tantos, os seguintes julgados do TJDFT, “verbis”:

“AÇÃO REGRESSIVA. SEGURADORA. SUB-ROGAÇÃO. CDC. INCIDÊNCIA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEIÇÃO. RESTAURANTE. SERVIÇO DE MANOBRISTA. CONTRATO DE DEPÓSITO. DEVER DE GUARDA. COLISÃO TRASEIRA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. TEORIA DO RISCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SOLIDARIEDADE ENTRE AS EMPRESAS. AJUSTE FIRMADO COM A SEGURADA. INEFICÁCIA. DEVER DE RESSARCIR OS DANOS. CONFIGURAÇÃO. 1. O Código de Defesa do Consumidor incide na relação jurídica entre a seguradora, que se sub-rogou nos direitos da segurada, e as empresas que prestaram serviços à consumidora (art. 349, CC). Precedentes do STJ e deste Tribunal. 2. O estabelecimento comercial que disponibiliza serviço de manobrista (valet) aos seus clientes é parte legítima para responder à pretensão de ressarcimento dos danos causados por suposta falha na sua prestação. 3. A seguradora sub-roga-se nos direitos dos seus segurados ao indenizá-los pelos danos cobertos pela apólice contratada, sendo-lhe assegurado o direito de regresso contra o efetivo causador do prejuízo (art. 786, CC). 4. A entrega de veículo em confiança a manobrista de empresa vinculada a restaurante configura contrato de depósito, mesmo que estacionado em via pública. 5. Comprovada a falha na prestação dos serviços, o restaurante e a empresa de valet a ele vinculada devem ressarcir os prejuízos que a seguradora teve com os reparos dos veículos envolvidos no acidente de trânsito causado pelo manobrista. A responsabilidade é solidária, objetiva e decorre da Teoria do Risco. 6. O acordo feito entre a empresa de manobrista e a seguradao é ineficaz em relação à seguradora (art. 786, §2º, CC). 7. Preliminar rejeitada. Recursos conhecidos e não providos. (Ac. 1.201.883, DJe 23/9/2019, 8 TC, Des. Rel. Diaulas Costa Ribeiro).”

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA. DEMANDA PROPOSTA POR SEGURADORA. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. MÉRITO. ROUBO DE VEÍCULO DEIXADO EM PODER DE EMPRESA QUE EXPLORA SERVIÇO DE MANOBRISTA (VALET). FORTUITO EXTERNO. ROMPIMENTO DO NEXO CAUSAL. DANOS MATERIAIS. IMPROCEDÊNCIA. 1. O julgamento antecipado da lide não caracteriza hipótese de cerceamento de defesa, quando o acervo probatório constante dos autos se mostrar suficiente para a solução do litígio. 2. “No serviço de manobristas de rua (valets), as hipóteses de roubo constituem, em princípio, fato exclusivo de terceiro, não havendo prova da concorrência do fornecedor, mediante defeito na prestação do serviço, para o evento danoso” (STJ, REsp 1.321.739/SP). 3. Tendo em vista que o evento roubo, embora provável, caracteriza fortuito externo, tem-se por não configurado o nexo causal entre o dano sofrido pela seguradora e o serviço de manobrista (valet) oferecido pelo restaurante, o que torna incabível a indenização por danos materiais vindicada com base no direito de regresso. 4. Recurso de Apelação conhecido e não provido. (Ac. 1.102.171, DJe 13/6/2018, 8ª TC. Des. Rel. Nídia Corrêa Lima).”

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