OS ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO E A VIZINHANÇA

Sabe aquele cachorro chato que, embora pequenininho, late sem parar e faz suas necessidades nas partes comuns do condomínio? E o síndico zeloso, no cumprimento das suas obrigações, reclama com o dono de animal que, por seu turno, o responde com uma convicção invejável: – o Regimento Interno (RI) só veda animais de grande porte, dane-se! E mais, até às 22h posso fazer barulho.

 

Está certo isso “Arnaldo”? ERRADO! Apesar de o RI autorizar a guarda de animais, o dono deve atentar-se para as regras do Direito de Vizinhança previstas no art. 1.277 e seguintes do Código Civil. Assim, por exemplo, se o bicho (de qualquer espécie) perturba o sossego (não importa o horário), põe em risco a saúde (fezes nas áreas comuns) e a segurança (o Pitbull “mansinho, que anda solto) dos condôminos, deverá adequar-se. Afinal, viver em grupo exige bom senso!

 

Já fui obrigado a mudar de endereço por um motivo inacreditável: o pássaro do vizinho do prédio ao lado “gritava” diariamente, às 5h:30 de todas as manhãs. Conversei com o “nobre” dono daquela “adorável” espécie e com “voz de pássaro” exuberante. Fui bem educado, todavia, sem sucesso. Se eu quisesse buscar o Judiciário, a Ação de Obrigação de Fazer c/c Multa Diária (astreinte) seria a solução. Mas, antes de ingressar em juízo, a tentativa de consenso e/ou o envio de notificação extrajudicial são boas alternativas. Sobre o tema, dentre outros, confere os Ac. 822286 e 1.243764 do TJDFT, “verbis”:

 

“DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO. CONVENÇÃO. ANIMAIS DOMÉSTICOS. VEDAÇÃO. CACHORRO DE PEQUENO PORTE. INCÔMODOS E TRANSTORNOS. PREVALÊNCIA DA NORMA CONVENCIONAL.
I. Segundo a inteligência dos arts.  1.333 e 1.334 do Código Civil, a convenção constitui a lei interna do condomínio edilício e por isso suas prescrições, desde que alinhadas com as leis e com a Constituição Federal, são imperativas e cogentes.
II. A convenção de condomínio é um espaço normativo no qual prepondera a autonomia da vontade, na medida em que a legislação em vigor permite que os condôminos estabeleçam as próprias regras de convivência dentro da órbita condominial.
III. Como toda norma jurídica, a convenção condominial deve ser interpretada à luz da legislação em vigor e dos princípios que a orientam. Não é por outra razão que existe sólida jurisprudência autorizando, em situações excepcionais, a permanência de animais domésticos em apartamentos, a despeito de proibição convencional, principalmente nas hipóteses de cão de pequeno porte que não causa incômodo aos moradores da agremiação residencial.
IV. Se a convenção veda a guarda de animais de forma genérica, é preciso verificar, no caso concreto, a vulneração de algum dos direitos de vizinhança expressos no art. 1.277 do Código Civil. Isso porque esse tipo de proibição objetiva exatamente preservar a segurança, o sossego e a saúde da comunidade que vive sob as regras do condomínio edilício.
V. Se a presença do animal não importa na violação dos direitos que a restrição estipulada na convenção busca resguardar, não há fundamento jurídico para impedir a sua presença no seio condominial. VI. Havendo prova de que o cachorro, embora de pequeno porte, provoca desassossego, intranquilidade e acirra inconformismos na coletividade condominial, não há como afastar a força normativa e a plena aplicabilidade da restrição contida na convenção de condomínio. VII. Recurso conhecido e provido. (Acórdão 8222286, 4T, DJE 3.10.14, Rel. Des. James Eduardo Oliveira).

 

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO COMINATÓRIA. TUTELA DE URGÊNCIA. CONDOMÍNIO. ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. CACHORRO DE MÉDIO PORTE. REGIMENTO INTERNO. MITIGAÇÃO DA NORMA NO CASO CONCRETO. RISCO AO SOSSEGO E HIGIENE DO CONDOMÍNIO. COMPROVAÇÃO AUSENTE. ART. 300, CPC. REQUISITOS PRESENTES. TUTELA DEFERIDA. 1. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 2. Segundo o Código de Processo Civil de 2015, em seu art. 300, caput, tanto para a tutela cautelar como para a tutela antecipada exige-se o convencimento do juiz da existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito. 3. Nada obstante normatização do regimento interno condominial, este E. Tribunal tem relativizado sua aplicação quando, em comparação com a simples vedação genérica à guarda de animais em áreas privativas dos condomínios edilícios e diante das provas e circunstâncias do caso concreto, seja possível concluir que a presença do animal não coloca em risco o sossego e a higiene do condomínio. Este é o caso dos presentes autos. 3. Presentes no caso em apreço elementos que comprovam a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela é medida que se impõe. 4. Registre-se que as questões em discussão neste recurso ainda serão objeto de particular análise na origem, momento em que se aferirá de forma inequívoca o direito reclamado pela autora/agravante. 5. Recurso conhecido e provido. Decisão reformada.  (Acórdão 1.243.764, 7T, DJE 4.5.20, Rel. des. Gislene Pinheiro).

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